Certamente você tomou conhecimento, se é que não participou, do desafio “dos 10 anos” lançado há algumas semanas nas redes sociais. O desafio mobilizou milhões de indivíduos, inclusive famosos, que realizaram “posts” de comparação da aparência física no decênio compreendido entre os anos de 2009 e 2019. Porém, talvez, não tenha se dado conta, de que essas “brincadeiras” podem oferecer riscos e até mesmo expor sua privacidade, sem que você perceba.
Da mesma forma, ao realizar um exame de sangue, por exemplo, você, não raras as vezes, se depara com um questionário infindável sobre seus dados pessoais que não possuem relação alguma com o exame solicitado.
Você já parou para refletir que, cotidianamente, informa seus dados pessoais a empresas, sem ao menos saber porque tais dados são coletados? E como estas empresas os armazenam? Por quanto tempo e com quem compartilham?
No caso do “desafio dos 10 anos”, as imagens serão utilizadas para alguma finalidade, além do “jogo” em si? Quem armazenou estas informações? Esses são questionamentos que ensejam a reflexão sobre o uso de dados pessoais e a privacidade.
Veja-se, os dados pessoais fornecidos a empresas que montam verdadeiros bancos de dados, contemplam um conjunto de elementos que dizem respeito a personalidade, revelando comportamentos e preferências do indivíduo, tornando-o um alvo fácil de publicidade direcionada de acordo com suas preferências estabelecidas.
A boa notícia, considerando os questionamentos formulados, é que o cidadão, a partir de fevereiro de 2020, contará com as disposições da Lei n.º 13.709/2018 – Lei Geral de Proteção de Dados -, e poderá saber como as pessoas naturais e as pessoas jurídicas (públicas e privadas) tratam seus dados pessoais. O texto legal determina que órgãos públicos e empresas privadas devam coletar apenas os dados necessários aos serviços que prestam, respondendo juridicamente por ele.Além disso, as empresas que coletaram dados pessoais devem ter, em seus quadros funcionais, um profissional encarregado de prestar esclarecimentos e aceitar as reclamações dos titulares das informações, seja em relação a coleta, tratamento, eliminação ou vazamento de dados. Será dele, também, o ônus de provar a obtenção e a função dos dados coletados, além do consentimento do titular que poderá pedir a interrupção da coleta de informações, a portabilidade e exclusão dos mesmos.
A Lei protege os dados pessoais chamados sensíveis, que são os que tratam de origem convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural . Essas informações só poderão ser coletadas ou compartilhadas sem o consentimento do titular em situações específicas, como o cumprimento de uma obrigação legal ou regulatória pelo controlador; uso para políticas públicas; e tutela da saúde, com procedimento realizado por profissionais da área da saúde ou por entidades sanitárias, entre outras previstas na Lei.
Assim, com a entrada em vigor da referida Lei, a pessoa natural ou a pessoa jurídica — de direito público ou privado —, que realiza o tratamento de dados pessoais deverão observar os ditames da legislação e, assim, rever os termos de uso e políticas respectivas quanto as informações que coletam e armazenam. Isso para evitar vulnerabilidade dos dados pessoais tratados, minimizando riscos de perda, vazamento ou destruição, sob pena de advertências e multas diárias que, de acordo com a previsão da lei - artigo 52, inciso II -, poderá atingir até 2% do faturamento da da pessoa jurídica de direito privado no último exercício, limitada, no total, a 50 milhões por infração.
O respeito à privacidade é um direito fundamental do cidadão, contemplado constitucionalmente. E, a Lei Geral de Proteção aos Dados Pessoais é o mais novo marco regulatório em prol da proteção à privacidade no Brasil.