O inexorável processo de globalização que atraiu inúmeras empresas e investimentos estrangeiros ao Brasil trouxe consigo alguns institutos jurídicos e administrativos de grande relevância para o desenvolvimento econômico do País. Dentre estas novidades, destacaram-se no País, desde a década de 1990, os chamados stock option plans, ou planos de opção de compra ou subscrição de ações.
Em linhas gerais, tais planos visam incentivar e reter empregados e prestadores de serviços considerados essenciais pela companhia, o que é feito com a outorga, após um determinado prazo de carência (vesting), do direito de adquirir ou subscrever ações da companhia por um valor predeterminado. Em outros termos, busca-se premiar empregados (geralmente altos executivos) ou mesmo prestadores de serviços com a participação nos rendimentos e na valorização do negócio que ajudaram a construir (CALVO, 2005, p. 1.126).
Como bem observa Nelson Eizirik, “como a lucratividade está vinculada à atuação eficiente dos administradores, a outorga de opção de compra de ações funciona como incentivo para que eles maximizem o desempenho da companhia, alinhando os seus interesses aos dos acionistas” (2010, p. 466).
No mesmo sentido, Rodrigo Moreira de Souza Carvalho (2002, p. 183):
Com efeito, o exercício pelos empregados, da opção de compra de ações (sejam da própria empresa brasileira ou, ainda, das empresas estrangeiras controladoras) negociáveis no mercado de capitais, pode resultar em consideráveis lucros, caso as ações venham a se valorizar durante o período de carência estabelecido no plano. E é exatamente esse período de carência que faz com que os empregados, principalmente aqueles que ocupam os altos escalões nas empresas, desejem continuar em seus postos de trabalho, não se deixando seduzir por ofertas de emprego e oportunidades da concorrência.
De modo mais específico, pode-se dizer que os stock option plans consistem no direito outorgado a empregados ou prestadores de serviços, durante determinado período de tempo, de subscrever ou adquirir ações da companhia – ou da sua controladora no exterior – a um preço determinado ou determinável. Todos os critérios atinentes à concessão e ao exercício deste direito estarão previstos em um plano (o stock option plan) previamente aprovado pela Assembleia Geral da companhia, conforme exige o art. 168, § 3º, da Lei das Sociedades por Ações (LSA):
O estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com plano aprovado pela assembleia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.
Em vista de tal dispositivo, verifica-se a existência de três elementos essenciais para a utilização dos stock option plans: “(I) a existência de capital autorizado; (II) a previsão expressa, nos estatutos da empresa, da possibilidade de concessão da opção de compra de ações a empregados; e (III) que o plano de oferta de opção de compra de ações seja devidamente aprovado pela assembleia geral da sociedade” (CARVALHO, 2002, p. 186).
A correta caracterização dos planos de stock options goza de enorme relevância, visto que, embora possuam, em regra, natureza mercantil, sua descaracterização – seja acidental ou com o propósito específico de fraude – pode ensejar o reconhecimento de natureza trabalhista, resultando em despesas não apenas indesejadas como não planejadas. Para que se tenha ideia do impacto decorrente desta descaracterização, destaca-se que, acaso constatada a natureza trabalhista dos planos, o benefício concedido pela empresa a seus empregados passa a integrar a base de cálculo de todos os direitos trabalhistas. Além disso, o reconhecimento da natureza trabalhista também enseja relevante impacto fiscal, visto que os valores recebidos estariam sujeitos à tributação sobre a renda proveniente do salário, que conta com alíquota progressiva de até 27,5%, em oposição aos usuais 15% aplicados sobre o eventual ganho de capital auferido pelo beneficiário quando da alienação das ações adquiridas em virtude do plano de opções (ARAGÃO, 2010, p. 171).
Com vistas a evitar, então, os impactos decorrentes do reconhecimento das stock options como verbas de caráter trabalhista, exige-se, pelo menos, que estas sejam facultativas aos beneficiários, além de onerosas, de modo que, ao exercer a opção de compra ou subscrição, o empregado ou prestador de serviços efetivamente pague pelas ações adquiridas ou subscritas, beneficiando-se apenas com a variação entre o preço de exercício e o preço de mercado das ações ou com os dividendos percebidos, caso opte por manter a participação acionária. Decorrência da própria onerosidade exigida dos planos, insere-se a necessidade que o beneficiário também se sujeite ao chamado risco mercantil, devendo arcar com a possibilidade de flutuação do valor de mercado das ações.
Tal posição vem sendo observada pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) em recursos versando sobre a incidência de contribuição previdenciária sobre os stock option plans. De acordo com o CARF, o mecanismo terá natureza mercantil (e, portanto, não estará sujeito à contribuição previdenciária) quando for facultativo aos empregados, oneroso e caracterizado pelo risco mercantil (VALOR ECONÔMICO, 2015).
Veja-se, nesse sentido, trecho do voto da Conselheira Carolina Wanderley Landim no julgamento do Recurso Voluntário nº 2401-003.045, apreciado pelo CARF em 18 de junho de 2013:
De fato, sendo, via de regra, a opção de compra de ações facultativa e onerosa ao beneficiário, que, inclusive, poderá experimentar prejuízos na operação, caso o preço de venda seja inferior ao preço pago pelas ações adquiridas, não é possível caracterizar a opção de compra de ações como remuneração, já que esta decorre diretamente da prestação de serviços, não estando sujeita a risco, muito menos à opção do trabalhador – prestado o serviço, a remuneração deve ser paga pelo contratante.
É certo, contudo, que não estando presentes as características essenciais do contrato mercantil de opção de compra de ações, poderá a fiscalização provar que se trata de forma de remuneração indireta, sobre a qual incidiria a contribuição previdenciária patronal.
Observados estes critérios, a tendência é que a jurisprudência, judicial e administrativa, mantenha sua posição atual e continue reconhecendo o caráter mercantil dos planos de stock options.
ARAGÃO, Paulo Cézar; SOARES, Daniela. Opções de compra de ações: uma análise da evolução do instituto no Brasil. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; MOURA AZEVEDO, Luís André N. de (Coord.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010.
BALANÇO do CARF sobre ‘stock options’ é favorável ao Fisco. Valor Econômico. São Paulo, 13 de janeiro de 2015. Disponível em: <http://www.valor.com.br/legislacao/3856444/balanco-do-carf-sobre-stock-options-e-favoravel-ao-fisco?utm_source=newsletter_manha&utm_medium=13012015&utm_term=balanco+do+carf+sobre+stock+options+e+favoravel+ao+fisco&utm_campaign=informativo&NewsNid=3856284>. Acesso em 29 de janeiro de 2015.
CALVO, Adriana. A natureza jurídica dos planos de opções de compra de ações no direito do trabalho (“employee stock option plans”). Revista LTr: Legislação do Trabalho. São Paulo: LTr, vol. 69, nº 09, set./2005.
CARVALHO, Rodrigo Moreira de Souza. Natureza jurídica das verbas recebidas por empregados, através de planos de opção de compra de ações (‘stock option plans’), à luz do direito do trabalho brasileiro. Revista LTr: Suplemento Trabalhista. São Paulo: LTr, vol. 38, nº 40/2002.
EIZIRIK, Nelson. Caráter intuitu personae da opção de compra de ações. In: CARVALHOSA, Modesto Souza Barros; EIZIRIK, Nelson. Estudos de direito empresarial. São Paulo: Saraiva. 2010.