Decisão judicial define critérios para perdimento de bens nas aduanas brasileiras

O Juiz da 1ª Vara Federal de Santana do Livramento - RS, em apreciação da ação civil pública ajuizada pelo Ministério

continuar lendo

O Juiz da 1ª Vara Federal de Santana do Livramento - RS, em apreciação da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, estabeleceu alguns limites, quantitativos e qualitativos, ao perdimento de bens nas zonas aduaneiras. Foram definidos, também, os itens que não poderão ser considerados incluídos na cota de isenção, bem como os critérios para cômputo dessa cota e o pagamento de eventuais multas.

 

De acordo com o estipulado na decisão, somente será aplicada a pena de perdimento quanto aos bens cujo valor representar a parcela que excede a da cota de isenção, equivalente, na época, a US$ 300,00 (hoje U$$ 150,00) [1].

 

A Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil nº 1059 a que a decisão judicial se refere, em seu art. 33, I e II, concede isenção a determinados produtos, independentemente de seu valor e de sua quantidade. É o caso dos livros, folhetos e periódicos – já isentos por força de disposição constitucional [2] – e dos bens de uso e consumo pessoal, como roupas e outros artigos de vestuário, artigos de higiene, e calçados, para uso próprio do viajante, desde que em quantidade e qualidade compatíveis com a duração e a finalidade da sua permanência no exterior.

 

Todavia, outros bens, listados pelos parágrafos do mesmo art. 33 da aludida Instrução Normativa, devem observar os limites quantitativos de isenção lá estipulados. Esses limites encontram-se definidos tanto por critérios de volume, massa e quantidade quanto pelo valor da cota.

Não são contabilizados, portanto, para fins de cálculo da cota de isenção, a partir do valor total dos bens, os livros e similares, tal qual outros itens de uso pessoal. Todavia, outros itens terão seu valor computado para apuração de eventual excedente.

 

O que a decisão judicial traz de interessante é que, na hipótese de exceder-se a cota de isenção concedida pela Instrução Normativa, se garante ao viajante poder escolher quais objetos deverão ser considerados incluídos na cota e quais deverão integrar a parcela excedente e, portanto, sujeitos ao perdimento.

 

A decisão antecipatória proferida pelo juiz da 1º Vara Federal ainda trata da multa equivalente a 50%  do valor excedente à cota de isenção nas hipóteses em que o viajante que tiver optado pelo canal “nada a declarar” carregar consigo bens que extrapolem os limites previstos pelo já mencionado art. 33 da Instrução Normativa 1059/2010.

 

Ao contrário do que determina o art. 6º, § 3º, da referida Instrução Normativa [3], a decisão em pauta assegura ao viajante a possibilidade de informar aos agentes da alfândega que não possui bens a declarar. Nesse contexto, em eventual revista a ser realizada pelos agentes alfandegários, considerada a hipótese de flagrar-se a posse de bens que conjuntamente atinjam valor superior ao estabelecido na cota de isenção, não poderá ser imposta ao viajante a multa por falsa declaração, uma vez que se trata de uma alegação neutra.

 

Caso ocorra discrepância entre a alegação neutra declarada e o conteúdo efetivo da bagagem do viajante, este poderá efetuar o pagamento do imposto incidente sobre o valor excedente. Em razão de tal circunstância, essa situação distingue-se da hipótese em que o viajante presta declaração falsa ou inexata de bagagem, ocasião em que será devida a referida multa.

 

Dessa forma, a determinação judicial oriunda da 1ª Vara Federal de Santana do Livramento garante ao viajante o direito de optar por quais itens devem ser considerados como incluídos na cota e quais devem sujeitar-se à parcela de excesso sujeita ao perdimento. Igualmente, assegura o afastamento de qualquer multa para as hipóteses em que as alegações neutras de declaração (“nada a declarar”) forem eventualmente contrariadas pelo resultado da revista da bagagem.

 

De toda forma, importa ressaltar que os termos da referida decisão serão aplicados somente nos municípios que abrangem o território submetido à jurisdição da Justiça Federal Santana do Livramento, sendo de caráter provisório e, em que pesem os termos da decisão proferida, esta se encontra sob discussão recursal perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, havendo possibilidade de reforma. Ainda assim, o ponto de vista exposto na decisão em comento pode significar um novo (e mais razoável) entendimento a respeito das regras sobre o perdimento de bens em aduanas.

 

Referência bibliográfica:

 

Ação Civil Pública da Justiça Federal da 4º Região n. 5002113-84.2015.4.04.7106;

 

Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009.

Instrução Normativa RFB nº 1059, de 02 de agosto de 2010

 

[1] O limite de US$ 300,00 (trezentos dólares americanos) referido pela decisão, previsto pelo art. 33, III, b, da Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil n. 1059, de 02 de agosto de 2010, foi reduzido para US$ 150,00 (cento e cinquenta dólares americanos) por força da Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil n. 1533, de 22 de dezembro de 2014.

[2] Conforme disposição expressa do artigo 150, VI, d, da Constituição Federal de 1988.

[3] “Art. 6º Ao ingressar no País, o viajante procedente do exterior deverá dirigir-se ao canal "bens a declarar" quando trouxer: [...] VIII - bens cujo valor global ultrapasse o limite de isenção para a via de transporte, de acordo com o disposto no art. 33; [...] § 3º A opção do viajante pelo canal "nada a declarar", caso se enquadre na hipótese referida no inciso VIII do caput, configura declaração falsa, punida com multa correspondente a cinquenta por cento do valor excedente ao limite de isenção para a via de transporte utilizada, sem prejuízo do pagamento do imposto devido, em conformidade com o disposto no art. 57 da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997”. BRASIL. Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa 1059, de 02 de agosto de 2010.