O exaurimento da contribuição social especial da lc 110/2001 e a sua atual ilegalidade

Até pouco tempo atrás, discutia-se sobre a constitucionalidade da Lei Complementar 110/2001, pois violaria, em tese, o disposto nos artigos 149 e 195

continuar lendo

Até pouco tempo atrás, discutia-se sobre a constitucionalidade da Lei Complementar 110/2001, pois violaria, em tese, o disposto nos artigos 149 e 195 da Constituição Federal de 1988, tendo em vista que estes artigos não permitiriam a criação de uma contribuição vinculada ao FGTS para custear quaisquer acontecimentos extraordinários.

 

Ocorre que, após o julgamento do Supremo Tribunal Federal, a Lei Complementar 110/2001 foi declarada constitucional e a natureza das contribuições sociais lá estipuladas foi declarada como de caráter  social e especial.

 

De fato, tais contribuições sociais especiais da Lei Complementar foram criadas para cobrir um déficit de 42 bilhões gerado entre os anos 1980 e 1990 em razão da correção errônea (a menor) dos valores constantes nas contas vinculadas do FGTS. Tal fato gerou diversas ações judiciais interpostas pelos trabalhadores, com decisões favoráveis pelo Supremo Tribunal Federal e, consequentemente, uma dívida considerável a ser saldada.

 

A Lei Complementar 110/2001 efetivamente proporcionou um acréscimo de valores ao FGTS pago diretamente pelos empregadores, mediantes dois tipos de contribuições (i) a do art. 1º, de 10% sobre o montante de todos os depósitos junto ao FGTS, devida pelos empregadores em caso de despedida imotivada do empregado e (ii) aquela prevista no art. 2º, à alíquota de cinco décimos por cento sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador. Essa última já foi extinta, pois tinha um prazo de vigência de 60 meses.

 

Assim, conforme se verifica com o advento da Lei Complementar, um terceiro (empregador), que não causou qualquer dano aos trabalhadores, se tornou o (indiretamente) responsável pelo pagamento de uma dívida que é de responsabilidade exclusiva da União.

Ocorre que, conforme demonstra a teoria pentapartidária dos tributos, os quais são impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições especiais e empréstimos compulsórios, as contribuições especiais são tributos afetados para fins específicos e, como tal, somente poderão ser cobradas quando destinadas àquela finalidade específica. Uma vez exaurido o fim para o qual a contribuição especial foi destinada, ela perde automaticamente sua legitimação constitucional, conforme a tal espécie tributária. Nesse sentido, é o que entende o professor de Direito Tributário Luís Eduardo Schoueri, ao lecionar que “as contribuições especiais têm como limite o custo das atividades que as motivaram” [1].

 

Com esse raciocínio, desde janeiro de 2007, a multa de 10% do FGTS passou a ser indevida, mas até o presente momento vem sendo cobrada dos empregadores. Com efeito, desde março de 2012, a multa está sendo destinada para outros fins sociais e não para aqueles que justificaram a sua criação. Fica claro, portanto, que essa cobrança contraria a  natureza tributária da contribuição em questão.

 

Nos dias de hoje, não restam dúvidas de que as contas vinculadas do FGTS já foram integralmente recompostas, pois, há mais de 13 anos, as empresas vêm efetuando o recolhimento da referida contribuição social e a Caixa Econômica Federal já se pronunciou relatando que a finalidade da lei complementar já foi cumprida. Na mesma linha, a Câmara dos Deputados, após estar ciente do exaurimento da finalidade e da necessidade da redução de encargos financeiros, em julho de 2013, aprovou o projeto de Lei Complementar n. 200/12, que foi vetado pela Presidenta da República, sob o fundamento de que esse “fundo” está sendo destinado para outros fins.

 

A própria justificativa do veto serve de fundamento para a extinção da contribuição, ou seja, se os recursos estão sendo direcionados para outra finalidade, não há mais fundamento para a sua manutenção. Nessa esteira, inclusive, pronunciou-se o Desembargador Leandro Paulsen [2], o qual afirmou que a contribuição social não poderia ser cobrada “ad eternum”. Cabe mencionar também a decisão proferida pela Juíza da 6ª Vara Federal, Ivani Silva da Luz, publicada no dia 12 de março de 2015, ao julgar o processo 0025995-44.2014.4.01.3400, no sentido de que a contribuição social prevista no artigo 149 da Constituição Federal de 1988 já cumpriu a sua finalidade, devendo, portanto, deixar de existir.

 

Assim, conclui-se que a contribuição social do art. 1º da Lei Complementar n. 110/2001, que é vista como contribuição social especial e que visa cobrir o déficit das contas vinculadas do FGTS, já cumpriu a sua finalidade, razão pela qual não há motivos para a sua manutenção e  a continuidade da sua cobrança constitui enriquecimento ilícito da União.

 

[1] SHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. São Paulo. Editora Saraiva, 2011

[2]http://www2.trf4.gov.br/trf4/processos/visualizar_documento_gedpro.php?local=trf4&documento=1878584&hash=1aa8d99751c12f967285aef7c3e8e460