Os perigos por trás da regulamentação dos contratos de produção integrada

Desde maio de 2016, há no país uma regulamentação específica para os contratos de produção integrada (contratos

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Desde maio de 2016, há no país uma regulamentação específica para os contratos de produção integrada (contratos de parceria entre o produtor rural e a indústria), a Lei Federal n. 13.288, que tem como um dos objetivos pacificar a discussão sobre o tipo de relação estabelecida entre o produtor rural — o integrado — e a indústria — a integradora —, excluindo-se, evidentemente, a relação cooperativa com a indústria.

 

Até o advento desta Lei, tais tipos de contratos recebiam influências das regras gerais de direito civil e de outras tantas não específicas, o que causava, perante o Poder Judiciário, decisões não uniformes sobre a sua caracterização. De fato, acabou-se estabelecendo um entendimento, pelo menos majoritário, de que a relação entre o produtor e a indústria era de natureza civil, inserido dentro de uma cadeia produtiva, no qual não incidiam as disposições sobre contratos agrários da Lei n. 4.504/1964 (o Estatuto da Terra).

 

O contrato de produção integrada (seja agrícola, pecuária, extrativa ou avícola) constitui-se, de maneira geral, de uma relação em que o produtor rural, normalmente proprietário de um imóvel rural, individualmente ou em economia familiar, com ou sem utilização de empregados ou colaboradores, o qual tem instalações destinadas à atividade, recebe de uma determinada indústria (integradora) filhotes para criação e engorda ou sementes para cultivo. Recebem também alguns insumos como rações, vacinas, outros medicamentos, assistência técnica (como a veterinária), e devem observar as exigências sanitárias e ambientais gerais e específicas, a exclusividade e a confidencialidade (tendo em vista a evidente existência de segredo industrial na atividade da integradora), em que os pagamentos, em regra, são feitos após o acerto final de cada lote.

 

Todavia, diante da hipossuficiência do produtor rural perante a indústria tomadora de seu serviço ou da sua produção, realmente a existência de regras mais claras sobre as contratações em questão fazia-se necessária. Com isso, foi publicada a Lei n. 13.288, de 16 de maio de 2016, que trouxe obrigações importantes ao integrador, como a necessidade de o contrato ser escrito com clareza, precisão e ordem lógica, indicação clara da fórmula para o cálculo da eficiência da produção e a necessidade de o produtor rural observar (pessoalmente) as obrigações (gerais) sanitárias e ambientais de sua atividade.

 

É positiva também a orientação para a criação de entidade paritária para fiscalização, controle e estabelecimento de parâmetros mínimos, entre outras coisas, para a relação das partes.

 

Contudo, a Lei peca em definições não muito exatas, exagera na intervenção na iniciativa privada, não observa que na maioria destes contratos existe segredo industrial envolvido (ou seja, desconsidera a necessidade de cláusula de confidencialidade), prevê uma responsabilidade ambiental concorrente do integrador com o integrado, impõe obrigações excêntricas à indústria e prevê a obrigatoriedade de criação (ou manutenção) de duas entidades, a FONIAGRO e a CADEC, mas com regras bastante intromissivas.

 

Por exemplo, a Lei refere que os contratos entre integrado e integrador são contratos agrossilvipastoris. Entretanto, tal palavra vincula-se à agricultura ou à pecuária realizada de forma simultânea ou sequencial com o cultivo de florestas [1], além de não fazer qualquer referência à produção avícola, apesar de expressamente descrever as outras atividades.

 

Ademais, há diversas disposições impondo ao integrador que se submeta aos valores de referência para remuneração do integrado definidos por tais entidades, às fiscalizações sobre custos dos insumos adquiridos (pelo integrador) para utilização na produção, à imposição de contratação de planos de modernização e à validação pelas entidades dos parâmetros técnicos do integrador. Da mesma forma, define que seria de responsabilidade do CADEC “dirimir questões e solucionar, mediante acordo, litígios entre os produtores integrados e a integradora” [2].

 

Ou seja, a Lei intervém excessivamente na iniciativa privada e nas questões técnicas internas, as quais são vinculadas à atividade particular do integrador. Ademais, tal regra acaba por interferir no funcionamento de entidades que devem ser associativas (FONIAGRO e CADEC).

Outro ponto perigoso é a responsabilização ambiental concorrente, quando deveria ser exclusiva de cada parte, na medida em que tal limite muitas vezes não é de fácil constatação e, portanto, irá impor à integradora, além da própria fiscalização, uma auditoria profunda dos integrados contratados que, por sua vez, pode ser entendida como corresponsabilização em eventuais danos.

 

De sorte que a Lei, apesar de bem intencionada, pode causar intensas discussões administrativas com os órgãos públicos fiscalizadores e com as duas novas entidades criadas, além de processos judiciais dispendiosos. Razão pela qual o cuidado com as disposições contratuais, com a orientação do integrado e, principalmente, com a implementação de rotinas de fiscalização técnica (inclusive jurídica) são medidas que devem ser observadas de perto pelas indústrias afetadas.

 

[1] Os sistemas agroflorestais (SAF´s) se encaixam perfeitamente pela necessidade de mudança e produção sustentável. Estes se dividem em 3 sistemas: silvipastoris (florestas com pastagens), silviagrícolas (florestas com agricultura) e agrossilvipastoris (florestas com agricultura e pecuária simultânea ou sequencial). Disponível em: < http://www.floratiete.org.br/sistema-agrossilvipastoril-integracao-da-lavoura-pecuaria-e-floresta/ >. Acesso em: 11 de ago. 2016

[2] Consoante os termos do inciso IV do § 4º do artigo 6º da Lei 13.288/2016.