Em acórdão recentemente publicado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça acolheu pedido de indenização por dano extrapatrimonial suportado por um bebê em decorrência de descumprimento contratual por parte de uma sociedade empresária, sendo a teoria da perda de uma chance o fundamento central do acórdão de lavra do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (REsp 1.291.247/RJ).
Os pais e a criança são autores de ação indenizatória de dano extrapatrimonial contra uma empresa contratada por aqueles ainda quando a mãe estava grávida. A contratada, especializada em recolhimento de material genético, deveria ter comparecido ao parto da criança para recolher do cordão umbilical células tronco que seriam armazenadas em laboratório para que, na hipótese de a criança vir a desenvolver alguma doença, serem utilizadas na busca da cura dessa. Entretanto, a preposta da empresa não compareceu ao parto, restando, portanto, descumprido o contrato.
O juízo do primeiro grau e o Tribunal Estadual acolheram o pedido de indenização aos pais, todavia, rejeitaram o pedido da criança, sustentando, basicamente, que essa não teria capacidade suficiente para entender e compreender e, portanto, suportar danos extrapatrimoniais, bem como porque tais danos seriam hipotéticos, não sendo, por conseguinte, indenizáveis. Neste sentido, a criança recorreu ao Superior Tribunal de Justiça com intuito de, também, perceber indenização, utilizando a teoria sobre a perda de uma chance como seu principal argumento.
Em seu voto, o relator acolheu o pedido da criança, entendendo que essa possuía legitimidade para ser indenizada pelos danos extrapatrimoniais, os quais se configuram, exatamente, na chance frustrada oriunda da falha na prestação de serviço da empresa contratada. Desta forma, destacou que o que se repara a partir da aplicação de tal não é o dano final, mas, sim, a própria chance, que nas palavras do relator “é a possibilidade de um benefício futuro provável, consubstanciada em uma esperança para o sujeito, cuja privação caracteriza um dano pela frustração da probabilidade de alcançar esse benefício”.
Uma vez perdida, definitivamente, pela criança, a chance de prevenir o tratamento de eventuais patologias se configura no objeto da indenização, cujo quantum restou fixado em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), pois a partir da análise dos autos, a Corte conclui que a criança tinha sido a principal prejudicada pelo ato ilícito da ré.
A teoria da responsabilização civil pela perda de uma chance surgiu como alternativa para indenizar a vítima de ato ilícito que teve retirada a possibilidade de obter um resultado aleatório. Sua concepção se deve em razão da atividade dos tribunais franceses, sem qualquer base legal que a disciplina, sendo que tal teoria tem sido utilizada como uma das hipóteses de reparação integral do dano.
O voto do acórdão em questão deteve-se à análise quanto à certeza do prejuízo suportado pela criança para fins de determinar a responsabilidade da empresa contratada. A certeza é o principal elemento do prejuízo a ser identificado pelo julgador para aplicação da teoria. Em outras palavras, quer dizer que se o prejuízo no que tange à perda de uma chance é certo e decorre de ato ilícito de determinado sujeito, a vítima deve ser reparada, visto que, antes da conduta do agente, a chance para obtenção de resultado aleatório existia .
Salienta-se que a teoria ainda encontra vários óbices quanto à sua aplicação pelos tribunais do país, motivo pelo qual se acredita que este precedente do Superior Tribunal de Justiça tornar-se-á uma referência para a utilização de mais esta técnica para fins de reparação civil.